EM NOME da revista ESTUDOS AVANÇADOS, gostaria de saudar a presença do professor Aziz Ab'Sáber, que acaba de acrescentar mais um tento à sua brilhante carreira de pesquisador publicando, pela Editora da USP, São Paulo, Ensaios, entreveros, um livro fartamente ilustrado, de mais de quinhentas páginas, com vinte e um textos, além de extensa bibliografia complementar, centrados em uma das maiores metrópoles do planeta, a nossa capital paulista. Ao professor Aziz os nossos cumprimentos.
Também gostaria de agradecer a presença do geólogo Gerôncio Rocha, a quem ESTUDOS AVANÇADOS deve o seu mais lúcido ensaio publicado sobre o Aqüífero Guarani, e dos jornalistas Ulisses Cappozoli, Mauro Bellesa e Ana Maria Fiori, que gentilmente aceitaram nosso convite para estarem presentes nesta entrevista.
Nunca é demais dizer que, no Brasil e fora dele, poucas pessoas conhecem tão bem os problemas da Amazônia brasileira como o nosso professor Aziz Ab'Sáber. Suas pesquisas foram fundamentais para o que se convencionou chamar de a Teoria dos Refúgios e Redutos. Segundo essa teoria, durante a última glaciação, a Amazônia ter-se-ia reduzido a pequenas reservas. Seu livro Amazônia: do discurso à práxis, também publicado pela Edusp, acaba de ganhar uma nova edição, pois desperta constantemente um grande interesse entre leigos e especialistas.
A pedido da revista, o nosso entrevistado apresentou inicialmente alguns tópicos que podem nortear as discussões de hoje sobre o tema. (Dario Luis Borelli)
A ordem da grandeza espacial da Amazônia
Aziz Ab'Sáber – Em primeiro lugar, é preciso relembrar que a Amazônia brasileira é um conjunto de paisagens e ecologias da América do Sul setentrional. Possuímos a maior parcela territorial dentro da Amazônia pan-americana.
Em segundo lugar, gostaria de destacar um fato relacionado aos diferentes domínios de natureza no Brasil. Depois de muita bibliografia, muita pesquisa, todo mundo chega à conclusão de que nós temos seis principais domínios de natureza no Brasil. Os geógrafos preferem domínios morfoclimáticos e fitogeográficos, os quais os biólogos chamam apenas de biomas – deveriam chamar de biomas continentais, mesmo porque existem zonobiomas, que são biomas que atravessam áreas muito grandes de um continente a outro e que reaparecem em continentes vizinhos. Então fica estabelecido, diante dos domínios de natureza, biomas continentais e zonobiomas, dos quais a Amazônia é uma parte de notável originalidade e extensão.
O problema de escala para a região amazônica é essencial: são quatro milhões e duzentos mil km2 de área, dezesseis a dezessete vezes o estado de São Paulo, com 95% do espaço total florestado. São florestas tropicais biodiversas de grande extensão, com alguns redutos de vegetação do passado – sobretudo redutos do cerrado, em Monte Alegre (PA), Amapá, miniredutos de cerrado no meio das campestres de Roraima. Na periferia das florestas amazônicas biodiversas ocorrem transições complicadas tanto ao sul quanto ao norte do corpo principal da grande floresta.
Na minha história de pesquisas, foi a região entre o Maranhão oriental, o Maranhão central e sudeste que possibilitou entender as chamadas faixas de transição e de contato. A Amazônia faz contatos muito fortes e transicionais com os cerrados e com os chapadões ocidentais do Maranhão, de modo que mais para o norte há um decréscimo de continuidade florestal. À parte disso, há um aspecto fundamental na Amazônia: todo o conjunto que fica entre a região cisandina (região interna dos Andes), até o golfão Marajoara, apresenta uma só e mesma drenagem, o que indica que a homogeneidade não está unicamente relacionada à presença de grandes extensões de florestas, mas também de uma drenagem que é como se fosse um leque, muito amplo, que fica entre a região cisandina e o começo do estrangulamento por terrenos cristalinos do planalto das Guianas e do planalto brasileiro setentrional, dando a impressão errônea de que é tudo muito homogêneo.
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