Brasil desenvolve modelo global de mudanças climáticas


Pesquisadores de diversas instituições, integrantes doPrograma FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), da Rede Brasileira de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais (Rede Clima) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Mudanças Climáticas (INCT-MC), concluíram a versão preliminar do Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre (BESM, na sigla em inglês).
Alguns dos primeiros resultados de simulações feitas com o novo modelo foram apresentados no Workshop sobre o BESM, realizado no dia 19 de fevereiro, na FAPESP.
“A opção do Brasil de enfrentar o desafio de desenvolver seu próprio modelo de sistema climático global, em vez de importar um modelo pronto e aplicá-lo, foi feita com o objetivo estratégico de construir uma rede de pesquisadores capazes de atuar em todas as dimensões da construção de um modelo desta natureza, como no desenvolvimento, validação e simulação”, disse Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG) e um dos idealizadores do BESM.
“Como nós temos uma comunidade científica atuante no desenvolvimento e integração dos componentes de um modelo do sistema terrestre de boa qualidade, mas ainda incipiente numericamente, não poderíamos dar um passo como o da Austrália – que tem uma enorme competência em modelagem climática e uma grande comunidade de pesquisadores especializados em todos os aspectos relacionados ao clima – de aprimorar um modelo em parceria com outro país”, explicou Nobre.
Contribuição brasileira
De acordo com Nobre e outros pesquisadores presentes ao evento, uma das principais contribuições do novo Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre para os esforços internacionais de avanço das ciências climáticas, ambientais e atmosféricas será olhar para algumas questões particulares do Hemisfério Sul e representar alguns processos ambientais importantes para o Brasil e outros países da América do Sul que são considerados secundários nos modelos climáticos internacionais.
Entre essas questões estão as queimadas, capazes de intensificar o efeito estufa e mudar as características de chuvas e nuvens de uma determinada região, por exemplo, e o desmatamento da Amazônia.
“Como é a própria comunidade científica brasileira na área de modelagem climática que desenvolve esse novo modelo do sistema terrestre, é mais lógico e até mais fácil, de certa forma, ela introduzir a modelagem desses fenômenos que são mais típicos da América do Sul”, avaliou Nobre.
A ideia do BESM, segundo Nobre, é ser uma plataforma aberta, em que várias hipóteses de processos que acontecem na América do Sul, no Oceano Atlântico e na Antártica, por exemplo, possam ser testadas pelos pesquisadores de áreas relacionadas às ciências climáticas e ambientais.
“O objetivo foi construir um modelo climático com competência brasileira que seja incorporado como uma contribuição do país para a construção de um sistema global de modelagem do sistema terrestre, como se pretende criar nos próximos anos”, disse Nobre.
“No futuro haverá um sistema global de modelagem do sistema terrestre por meio do qual será possível montar um modelo climático por módulos que interessem a um pesquisador para testar suas hipóteses”, estimou.
Previsões climáticas
O Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre também deverá ser utilizado para a definição de políticas públicas no Brasil de adequação do país aos impactos das mudanças climáticas globais.
De acordo com o Relatório Especial sobre Gestão dos Riscos de Eventos Climáticos e Desastres (SREX, na sigla em inglês) – divulgado recentemente pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) –, nas últimas décadas aumentou a frequência dos eventos climáticos extremos no mundo em função das mudanças climáticas.
No final de março de 2004, por exemplo, a região Sul do Brasil foi atingida pelo furacão Catarina – o primeiro de classe 1 (com ventos de 119 a 153 quilômetros por hora e elevação do nível do mar de 1,2 a 1,6 metro) registrado no país.
Primeiros resultados
Segundo o pesquisador, o desenvolvimento do novo modelo possibilitou melhorar a previsão de precipitação (chuva) no Atlântico Sul e na América do Sul. Outro resultado da implementação do modelo foi a constatação de que o desmatamento da Amazônia aumenta a possibilidade de ocorrência de El Ninõ (fenômeno caracterizado por um aquecimento anormal das águas superficiais no oceano Pacífico Tropical, capaz de afetar o clima regional e global).
O Brasil ainda passou a ter a capacidade de executar a previsão da extensão de gelo marinho do planeta.
“Pela primeira vez no país existe capacidade de prevermos o avanço e a retração do gelo marinho não só no Hemisfério Sul, onde existe uma grande dificuldade de realizar previsões de extensão de gelo, com em outras parte do planeta”, disse Paulo Nobre.
Aprimoramentos
O novo modelo foi construído a partir da experiência em modelagem climática, implementada no Brasil a partir da década de 1990 com a criação, no Inpe, do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC).
A fim de desenvolver o projeto, os pesquisadores utilizaram um modelo climático acoplado (unido) de oceano e atmosfera desenvolvido pelo CPTEC há mais de uma década, e introduziram nos últimos anos outros componentes, como vegetação dinâmica, hidrologia continental, ciclo de carbono dos oceanos e gelo marinho.
Para integrar esses diferentes componentes do modelo, os pesquisadores utilizam o supercomputador Tupã, instalado no final de 2010 no CPTEC, em Cachoeira Paulista (SP), com recursos da FAPESP e do MCTI.
As simulações brasileiras foram submetidas ao Projeto de Intercomparação de Modelos Acoplados, Fase 5 (CMIP5, na sigla em inglês), que deverá ser utilizado pelo IPCCpara balizar seu quinto Relatório de Avaliação (AR 5, na sigla em inglês), previsto para ser publicado no final de 2014.
Fonte:
MundoGeo

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